6702.jpg

 

Nota da Editora: Sou uma apaixonada dos contos. Eles levam-nos para um mundo maravilhoso por onde é bom passar(...)

Todos nós temos um contador dentro de nós (talvez o texto que se segue o ajude a perceber melhor isto) Já agora: já descobriu o seu??? O mundo agradecerá...

 

Maria Lua

 

Talvez você nunca tenha ouvido falar nos Contadores de Histórias, mas eles são seres encantados que povoam o mundo real e levam encantamentos e poesia para todas as pessoas. O Contador é Senhor do Tempo e usa as histórias para revelar verdades da vida. Desde o início dos tempos, o conhecimento era transmitido de forma oral pelos homens primitivos. Sentar em volta do fogo, ao redor de uma mesa, em bancos de cozinha vinham sempre acompanhados de histórias. Mas, com o advento de novas tecnologias, este hábito ficou adormecido por muito tempo, e o homem desaprendeu a ouvir. Há algum tempo, entretanto, o resgate da tradição oral vem ganhando força, e a cada dia surgem novos contadores de histórias. Grupos se formam, e essas pessoas, que foram um dia chamadas de povo encantado, voltam a habitar o mundo. O trabalho dos Contadores de Histórias tem o objectivo de resgatar a tradição oral e o ensinamento contido nas histórias. De forma subtil e agradável, eles têm o poder de conduzir os ouvintes a mundos encantados. O conto ressurge com intensidade nas escolas e passa a ocupar vários espaços alternativos. Hoje se conta histórias em hospitais, bibliotecas, empresas, bares, restaurantes, praças, palco etc. em qualquer lugar onde existam pessoas dispostas a emprestar seus ouvidos generosos para ouvir e se encantar com um conto, pessoas com o coração aberto para aprender e ensinar. Surge a figura do contador "Profissional". Essa "profissionalização" é extremamente positiva, gerando um cuidado com a linguagem, com a selecção dos contos e com a adequação do conteúdo. Mas, o risco de se tornar mais um instrumento de massificação é muito alto. O uso de adereços como fantoches, fantasias, cenários, pode e deve ser feita, mas de forma cuidadosa, pois contar histórias não é teatro. O contador de histórias tem uma missão que não pode ser abandonada ou feita pela metade. Quem começa a contar não pode nunca parar, pois desempenham um papel fundamental para que o mundo seja mais mundo, que a vida seja mais vida e para que nós sejamos mais humanos. A intenção do contador de histórias tem que ser muito clara. O conto deve ser doado ao ouvinte. Para que isso aconteça, é necessário que haja uma completa integração entre conto e contador, que um esteja apaixonado pelo outro. O processo de escolha do conto é bilateral, tanto o contador escolhe o conto, como o conto escolhe o contador. A história precisa fluir através do contador, que passa a ser um instrumento deixando que a mensagem saia de seu coração para o coração dos ouvintes. A preparação para uma boa maneira de contar começa assim com uma grande paixão: contador lê ou escuta um conto e eles se enamoram; o conto invade o corpo do contador e passa a fazer parte dele; o contador despe o conto, compreendendo cada pedacinho dele; o conto revela o seu interior ao contador; o contador coloca uma roupa nova no conto, bem ao seu gosto; os dois se sentem felizes juntos e passam horas se admirando, se estudando; o contador revela o seu amor e conta para todos o conto que o escolheu e que por ele foi escolhido. Neste momento, o contador é o próprio conto, e o conto a sua história. Além destes pontos fundamentais, o contador dispõe de algumas técnicas de expressão corporal e vocal, relação com o espaço, expressão do olhar, vocabulário etc. O contar dos contos deve ter ritmo, pausas, variação do tom de voz. Eventualmente o contador pode criar vozes para personagens ou para um personagem especial. A história não deve ser gritada, e sim contada em bom tom, com a voz bem colocada. É importante que as palavras sejam bem articuladas e as frases ditas até o final em tom audível. As pausas são necessárias para que o ouvinte vá construindo as imagens em sua mente e vivenciando, juntamente com o contador, cada pedacinho da história. O uso de gestos suaves, movimento de corpo também podem complementar o trabalho. Deve-se evitar andar muito, fazer movimentos bruscos, pois essas coisas desviam a atenção do público, fazendo com que ele perca o fio da história. Outro ponto importante é o olhar. O contador precisa olhar nos olhos dos ouvintes. Os olhos são a melhor forma de prender a atenção do público. Um olhar para o nada não prende ninguém. A linguagem deve ser adequada ao conto de acordo com o vocabulário do contador e o público. Quando se conta uma história deve-se evitar descrições longas, mais apropriadas para serem contadas. O contador consegue melhor resultado quando utiliza metáforas para descrever, pois cada ouvinte tem um espaço livre para criar, imaginar o que quiser. Por exemplo, quando se diz que a princesa era linda, tinha cabelos com longos cachos dourados, olhos azuis e boca vermelha está se apresentando um modelo pronto de beleza criado pelo autor ou contador. Esse modelo pode não ser o que o ouvinte considera belo. Portanto, seria bem melhor dizer que a princesa era tão linda quanto a lua em seu quarto crescente. Com isso, o ouvinte imagina a beleza que quiser e viaja num universo livre, desprovido de padrões. Vale ainda salientar que o contar é livre, que não existe receita para se contar. Pode-se contar com o auxílio do livro, de bonecos, de fantoches ou apenas com a voz. O importante é que o contador esteja à vontade. As técnicas disponíveis são apenas instrumentos que facilitam o fluir e a comunicação. O contador deve ouvir o coração, pois este lhe mostrará o verdadeiro caminho."

publicado por MariaLua às 11:55