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Esta manhã enquanto pesquisava na net encontrei este poema que desejo profundamente partilhar convosco...

 

 

Um Abraço: Maria Lua

 

 

 

Poema Árabe

 

 

O meu filho coloca a sua caixa de pintura à minha frente

E pede-me que lhe desenhe um pássaro.

Mergulho o pincel na cor cinzenta

E traço um quadrado com fechaduras e grades.

Os seus olhos enchem-se de surpresa:

"... Mas isto é uma prisão, pai,

Não sabes desenhar um pássaro?

E eu digo-lhe: "Filho, perdoa-me.

Esqueci-me da forma dos pássaros.

O meu filho coloca o livro de desenhos à minha frente

E pede-me que desenhe uma espiga de trigo.

Pego num lápis

E desenho uma arma.

O meu filho desdenha da minha ignorância, perguntando,

"Pai, não sabes a diferença entre uma espiga de trigo e uma arma?"

Eu digo-lhe: "Filho, uma vez usei a forma da espiga de trigo

a forma do pão

a forma da rosa

Mas nestes tempos duros

as árvores da floresta juntaram-se

aos homens da milícia

e a rosa veste uniformes escuros

Neste tempo de espigas de trigo armadas

de pássaros armados

de cultura armada

e de religião armada

não se pode comprar pão

sem encontrar uma arma no interior

não se pode colher uma rosa do campo

sem que os seus espinhos nos arranhem o rosto

não se pode comprar um livro

que não vá explodir entre os nossos dedos."

O meu filho senta-se à beira da minha cama

e pede-me que recite um poema

Uma lágrima cai dos meus olhos para a almofada.

O meu filho apanha-a, surpreendido, dizendo:

"Mas esta é uma lágrima, pai, não é um poema!"

E eu digo-lhe:

"Quando cresceres, meu filho,

e aprenderes o 'diwan' da poesia árabe

descobrirás que palavra e lágrima são gémeas

e que o poema árabe

não é mais do que uma lágrima chorada

por dedos que escrevem."

O meu filho pega nos seus pincéis,

a caixa de pinturas à minha frente

e pede-me que lhe desenhe uma pátria.

O pincel treme nas minhas mãos

e eu afundo-me, chorando.

 

Nizzar Qabbani

publicado por MariaLua às 14:23